11 dezembro 2006

As bacantes (1)

São Paulo, 29/9/2001

Sábado à noite, eu decidindo o que fazer. A primeira opção era ir à festa de aniversário da Meg, namorada do Cássio, num barzinho da Vila Olímpia. Como eu tinha planejado fazer alguma coisa com a Marcela e ela não gostou dessa opção, por não conhecer o pessoal, por não gostar do ambiente (e por ser "chata" mesmo...), resolvemos dar uma olhada na programação de teatro.
A primeira peça que surgiu foi "As bacantes", do José Celso Martinez Correa. Eu conhecia o diretor por ser polêmico, e já tinha ouvido falar da peça. Pelo que entendi, era uma remontagem; ela voltava a entrar em cartaz depois de seis anos do sucesso da temporada anterior. Consegui convencer a minha amiga a ver essa peça mesmo, e não qualquer outra que estivesse passando.
Ligamos e ainda tinha ingresso. Procurei a rua Jaceguai no mapa e me dei conta de onde era o teatro; eu tinha ido assistir a uma peça ali com a minha mãe havia pouco tempo. Quando chegamos, descobri que, na verdade, eu já tinha ido era ao Teatro Imprensa, quase ao lado, e não ao Teatro Oficina, onde estávamos indo agora. Compramos os ingressos por volta das 20 horas e, como ainda faltava quase uma hora para começar o espetáculo, resolvemos dar uma volta, apesar da fila que já começava a se formar.
Subimos até o Teatro Imprensa, a Marcela percebeu uma diferença no tipo de público com relação ao Oficina, fomos tomar um chope num bar. Às oito e meia eu já estava impaciente para ir para a fila e ajudei a matar o chope dela. A fila já estava imensa, como eu tinha previsto, e a Marcela começou a reclamar que achava um absurdo ter que pagar pelo ingresso e não ter lugar marcado; ela preferia assistir a uma peça de graça na USP.
Eu queria ler o prospecto da peça, que parecia muito interessante. Na capa, um cara vestido com uma roupa de couro, uns chifres, uma capa, à Batman, com uma abertura redonda na região da virilha que mostrava o pau e o saco. Nas páginas de dentro, mais gente pelada: mulheres, homens, em cenas bastante explícitas. Comecei a me lembrar de que peça se tratava. Enquanto isso, uma garota contava alguma coisa a um casal de amigos, falando alto. A Marcela me disse: "Nossa, parece que ontem terminou às duas da manhã". Mas como tínhamos a informação de que aquela era a noite de estréia, deveriam estar falando de outra coisa. Eu estava lendo o texto do prospecto, uma coisa muito doida. Pelo que consegui depreender da linguagem cifrada e panfletária, a peça e o diretor eram eminentemente paulistanos, o Teatro Oficina era um projeto vanguardista da Lina Bo Bardi e estava ameaçado de demolição ou de deglutição para a construção de um shopping ou expansão dos prédios do grupo Sílvio Santos, respectivamente, com a complacência da Secretaria de Cultura, só não consegui descobrir se estadual ou municipal, mas provavelmente ambas.
Aos poucos fui me dando conta da encrenca em que estava me metendo... A duração da peça era de 225 minutos, o que nas minhas contas dava quase quatro horas de espetáculo, com dois intervalos.

19 novembro 2006

Zé Fini

Há algumas décadas, a influência cultural francesa foi substituída pela estadunidense, aqui em terras brasileiras. A tal ponto que, hoje em dia, muitas palavras francesas presentes em marcas, nomes de lojas, pratos, etc, são pronunciadas como se fossem inglesas. E parece ser pequeno o interesse do brasileiro médio por outras línguas estrangeiras além do inglês.
Aqui não cabe juízo de valor com relação à superioridade de uma cultura em relação a outra. É certo que na época da influência francesa, a humanidade se preocupava mais com filosofia, literatura, ciências humanas em geral, enquanto hoje se preocupa mais com as artes visuais, sonoras e as maravilhas da técnica. Mas isso parece se dever mais a uma mudança cultural generalizada do que à metrópole cultural que passou a exercer influência sobre nós. Agora como dantes, com exceção de algumas áreas artísticas, notadamente a música e um certo tipo de literatura, continuamos na periferia da produção cultural mundial, mantendo uma mentalidade de colonizados e imitativa de outros pólos culturais, localizados sobretudo no hemisfério norte ocidental.
Hoje à tarde eu estava tomando um café no Regina e ouvi de novo alguém usar a expressão que deu título a este artigo. Tenho a impressão de que ela se popularizou a partir do quadro "Escolinha do Professor Raimundo", do Chico Anysio, há alguns anos. Muito embora não soubessem o que significava, seus espectadores achavam-na engraçada e passaram a repeti-la, com uma pequena corruptela sonora que transformou o [s] inicial em [z]. Da mesma maneira que se repetia o "somebody love" [sãm·bóri·lóv(i)] do personagem Rolando Lero.
A propósito: a expressão original era "C'est fini". Escreve-se dessa maneira, pronuncia-se [sέ finí] e significa "acabou".

Os mistérios universais

Um sujeito tem dois gatos em casa. Como os gatos preferem beber água fresca, ele teve a idéia de instalar uma fontezinha que jorra água quando ligada na tomada e apenas dá a impressão de que a água está sendo renovada. Quando desligada, a fonte apresenta um reservatório de água que também pode ser bebida pelos gatos.
O sujeito liga a fonte algumas vezes por dia, quando lhe dá na telha. Às vezes, os gatos bebem a água mesmo com a fonte desligada, mas, na maioria das vezes, ficam esperando a água começar a jorrar. Eles sabem que o dono tem algum papel no funcionamento da fonte, tanto que às vezes pedem para que ele faça a água cair, seja miando, seja subindo na borda da fonte e esperando. É possível perceber a curiosidade despertada nesses felinos pelo misterioso funcionamento de sua fonte de água.
Fico imaginando a dificuldade que seria para os gatos entenderem que uma pequena bomba de água, movida a eletricidade, suga a água que está embaixo, faz com que ela suba através de um tubinho e, depois, com que ela saia por dentro do pote que é sustentado pelos braços de um anjinho neoclássico e caia em cima de um pedestal móvel que não tem outra função senão evitar que a água respingue para fora da bacia.
Tudo isso é aparentemente simples para nós, mas não para os gatos. Às vezes nos comparo, os humanos, a esses gatos, quando pensamos nos mistérios do universo. Imaginem a nossa decepção se descobríssemos que o seu funcionamento, além de muito complexo para a nossa compreensão, apenas tivesse a função de nos manter vivos e fosse totalmente desprovido de um sentido maior. Talvez seja melhor mantermos nossas crenças e superstições, nelas incluídas a ciência e a religião.

07 agosto 2006

Desencanto

"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."

Essa frase, proferida no início do século XX por Rui Barbosa, traduz meu sentimento atual com relação ao mundo.

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Desde que escrevi o desabafo acima, já encontrei essa frase do Rui Barbosa reproduzida tantas vezes, em diferentes veículos e pelos mais variados tipos de pessoas, que fiquei triste com a sua banalização.
De tanto repetir-se em vão, uma frase acaba perdendo a sua força, quando não assumindo um papel contrário.

Tradução

Esta é a minha principal atividade, que me proporciona os recursos financeiros para todas as outras. O link abaixo é o meu currículo profissional:

Carlos Teixeira - Brazilian Translator